sábado, 30 de janeiro de 2016

A bravura das castrejas (Castro Laboreiro, 1875)

Castro Laboreiro (Melgaço)

Recuamos até 1875. Espanha está em guerra civil, está em curso a terceira guerra carlista. Frequentemente, guerrilheiros galegos atravessam a fronteira e procuram refúgio nos montes em Castro Laboreiro. Existe uma forte presença de soldados portugueses em terras castrejas para evitar a entrada de combatentes galegos em território português.
Este clima de tensão na fronteira é falado no Brasil no “Jornal do Commercio” na sua edição de 17 de Setembro de 1875. No dito periódico, faz-se alusão a uma notícia do jornal valenciano “O Noticioso” nestes termos:
“O Noticioso de Valença dá a seguinte notícia que eloquentemente revela qual o espírito do povo na raia portugueza: Fallando-se ha dias em Castro Laboreiro, que parte dos voluntários galaicos que se tinham sublevado em Entrimo, estavam dispostos a vir àquela povoação atacar o destacamento que alli está, e fazer distúrbios, vingando-se deste modo de lhe haverem prendido um companheiro que vinha para Tuy, de que demos notícias em um dos números passados, os habitantes daquella povoação trataram de se armar para coadjuvarem o commandante do destacamento, afim de oppôrem resistência à passagem dos revoltosos.
“Dizem-nos que era para admirar a coragem dos habitantes de Castro Laboreiro. Não foram só os homens que se prepararam para o ataque. As mulheres, com fouces, machados e outros instrumentos bellicos, estavam também dispostas a entrar em acção. Felizmente, não foi necessário experimentar a bravura das castrejas, que deram a conhecer que ainda não acabaram as padeiras de Aljusbarrota, nem as Ignezes Negras, heroínas de Melgaço.”
E pode-se assegurar que em todo o norte do paiz, o espírito e sentimento popular não destoam do dos habitantes de Castro Laboreiro.”

Acerca da bravura dos castrejos e dos castrejos, está tudo dito...

Cabeçalho do "Jornal do Commercio", edição de 17 de Setembro de 1875

"Jornal do Commercio", edição de 17 de Setembro de 1875, corpo da notícia citada

sábado, 23 de janeiro de 2016

Os ataques à Guarda Fiscal de S. Gregório e Castro Laboreiro nos jornais franceses (1912)


Antiga Ponte Internacional de S. Gregório/Ponte Barxas sobre o rio Trancoso em 1903

Em Portugal, a República foi implantada em 5 de Outubro de 1910. A reação monárquica à implantação da República sucedeu quase de imediato. E o rosto dessa contra-revolução foi o militar condecorado, católico fervoroso e monárquico convicto Henrique Mitchell de Paiva Couceiro. Refugiado na Galiza, Paiva Couceiro foi o cérebro de duas incursões falhadas no Norte do País, em 1911 e em 1912.
Em 1911, a revista “O Occidente”, na sua edição de 20 de Outubro alude para a presença ameaçadora dos monárquicos na Galiza prontos para uma invasão pela fronteira norte portuguesa, especialmente por Melgaço e Monção. Na dita publicação, pode ler-se que “É entre estas vilas portuguesas, da província do Minho, que se defrontam com Galisa, que se vê a velha ponte romana, compondo o cenário extremamente pitoresco de toda a região do nosso lindo Portugal.
   São estas duas vilas, Melgaço e Monsão, das mais históricas do Minho, por feitos heróicos dos seus filhos nas guerras em defesa da integridade da pátria contra os assaltos de seus visinhos de Espanha.
   Então como agora são as terras de fronteira que despertam as atenções do público por serem o campo de acção dos que conspiram contra o novo regime.
   Refugiados na Galisa, mercê do governo de Espanha que lhes dá quartel,  os conspiradores portuguêses tentaram passar as fronteiras pelo Minho, antes de o fazerem agora por Traz-os-Montes, realisando de facto a incursão das suas forças por Vinhaes, entre Chaves e Bragança.
   O insucesso dessa incursão foi noticiado pelos telegramas, mais ou menos contraditórios sobre os resultados da aventura, sendo, todavia, certo que houve recontro com as tropas do governo, em que de parte a parte se deram ferimentos e até mortes.
   Entretanto os conspiradores não lograram seu intento, e debandaram novamente para a fronteira da Galisa, onde parece que se conservam uns, enquanto outros desanimados dispersaram-se abandonando seus camaradas, à frente dos quaes se encontra Paiva Couceiro.
   Agora voltam novamente suas vistas para o Alto Minho, tentando entrar em Portugal por algum destes postos de fronteira.
   Não é fácil prever quanto durará tal situação desde que estas incursões tomaram o caracter de guerrilhas, como em tempos, que já lá vão, aconteceu com os celebres Remichido e Galamba, nas lutas liberaes, que por muito tempo inquietaram e não pouco prejudicaram as provincias do Alentejo e do Algarve, especialmente.
   A Historia vae, infelizmente repetindo-se. É o mesmo povo, é o mesmo país, são as mesmas paixões, e quasi um seculo decorrido, parece tudo encontrar-se na mesma ignorancia e por isso no mesmo fanatismo!"
Uma outra publicação da época, “O Carbonário”, na sua edição de 2 de Julho de 1911, mostra-nos o depoimento de um tal Botelho de Sousa que terá conhecimento de apreensões de armas na Galiza para serem passadas para Portugal e outro armamento que terá mesmo conseguido passar a fronteira. Essa apreensão teria sido feita por republicanos espanhóis. O mesmo Botelho de Sousa refere que “se não fosse a sua vigilância aturada, todo esse armamento tinha passado a fronteira, como estou convencido que passaram outras remessas numerosas, que a esta hora estão acoitadas em logar seguro”. Então, o jornalista pergunta: “Em que região?” Botelho de Sousa esclarece: “Em várias... Mas, estou convencido de que, se procurarem em Suajo, Peso de Melgaço e Monsão, lá encontrarão alguma cousa...”
Nestes anos após a implantação da República, os monárquicos refugiados na Galiza levaram a cabo uma série de incursões e escaramuças em território português na zona raiana e em particular em Melgaço. Exemplo dessas incursões são os ataques realizados por parte do monárquicos aos postos da Guarda Fiscal de Castro Laboreiro e S. Gregório em 1912. Estes acontecimentos foram notícia em jornais franceses. No periódico “La Presse”, na sua edição de 1 de Maio de 1912, encontramos a seguinte notícia:
”Ofensiva dos monárquicos portugueses”
Movimentações na fronteira
Lisboa, 30 de Abril – O Novidades publicou um despacho de Monção, de 29 de Abril, dá-nos conta que alguns monárquicos terão assaltado um posto da Guarda Fiscal em Castro Laboreiro, na fronteira portuguesa, e retirou-se de seguida para Espanha. A guarnição de Monção já foi contactada.
Porto, 30 de Abril – Existe o rumor de que os monárquicos portugueses, exilados em La Cañiza, invadiu S. Gregório, na fronteira. Eles invadiram o escritório de alfândega e retiraram-se de seguida para La Caniza. Reforços de tropas serão enviadas para a fronteira.”

Jornal "La Presse", cabeçalho da sua edição de 1 de Maio de 1912


Jornal "La Presse", edição de 1 de Maio de 1912, corpo da notícia citada


Num outro jornal francês, o “Le Temps”, na sua edição de 1 de Maio de 1912, dá-nos conta dos mesmos acontecimentos na seguinte notícia:

“PORTUGAL
Incursões realistas

O Novidades de Lisboa publicou um despacho de Monção, na fronteira com a Galiza, onde dá conta que um grupo de exilados realistas portugueses assaltaram um posto da Guarda Fiscal em Castro Laboreiro, e fugiram para Espanha logo de seguida.
A guarnição de Monção foi contactada.
De acordo com outra versão atualizada no Porto, um grupo de monárquicos exilados na Galiza fizeram uma incursão em S. Gregório, junto à fronteira. Invadiram o posto da Guarda Fiscal e roubaram as armas, regressando a La Caniza logo de seguida.”

Jornal "Le Temps", cabeçalho da sua edição de 1 de Maio de 1912

Jornal "Le Temps", edição de 1 de Maio de 1912, corpo da notícia citada


As incursões dos monárquicos em território português iriam continuar até à derrota da Monarquia do Norte em 1919...



Informações recolhidas em:
- “La Presse”, edição de 1 de Maio de 1912.
- “Le Temps”, edição de 1 de Maio de 1912.
-  “O Carbonário”, Semanário Republicano Radical. Nº 32; Edição de 2 de Julho de 1911.

- “O Occidente, Revista Ilustrada de Portugal e do Estrangeiro. Nº 1181; 20 de Outubro de 1911. 

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Simplício de Lima - O último soldado melgacense morto na 1ª Guerra Mundial




Hoje cumprem-se 99 anos sobre o episódio mais negro da participação portuguesa na 1ª Guerra Mundial, a Batalha de La Lys, na Flandres francesa. Numa guerra em que morreram 10 soldados oriundos de Melgaço, lembramos hoje o último soldado melgacense a falecer na 1ª Guerra Mundial. Refiro-me ao soldado Simplicio de Lima, de Penso. 
Simplício nasceu a 18 de Junho de 1893 no lugar de Paranhão, lugar da freguesia de Santiago de Penso, concelho de Melgaço. Era filho de Maria Teresa de Lima, sem referência ao nome do pai. Era solteiro e morava, à data da incorporação, na mesma freguesia de Penso. Soldado do 1º Esquadrão do Regimento de Cavalaria nº 4, foi incorporado no Corpo Expedicionário Português e embarcou para França em 26 de Maio com destino a Brest (França). Foi-lhe atribuída a placa de identificação nº 20 540.
Esteve em combate no Norte de França onde sofreu ferimentos. A guerra terminia em 11 de Novembro de 1918 com a assinatura do Armistício.
Contudo, em 2 de Dezembro de 1918, o soldado Simplicio encontrava-se internado por causa de ferimentos sofridos anteriormente em combate. Viria a falecer em 18 de Dezembro seguinte devido a uma bacilose pulmonar. Encontra-se sepultado no Cemitério Militar Português de Ambleteuse (França), coval 57, caixão nº 112.

Confira estas e outras informações no seu Boletim Militar Individual.
(Clique nas imagens para ampiar)








Seputura militar do soldado Simplicio de Lima
Cemitério de Richebourg l`Avoué (França), Talhão D, Fila 22, Coval 4


domingo, 17 de janeiro de 2016

Nicolau Lobato - Um soldado melgacense na 1ª Guerra Mundial

Soldados portugueses nas trincheiras de França

Assinala-se nesta ano de 2016, o primeiro centenário do início da participação de Portugal na Primeira Guerra Mundial na Europa. Foi nesse ano que a Alemanha declarou guerra a Portugal. Em 1917, embarcaram os primeiros contingentes de soldados para França. Foram dezenas de melgacenses que serviram a Pátria neste conflito. A maior parte destes foram integrados na chamada "Brigada do Minho" que correspondia à 4ª Brigada de Infantaria do Corpo Expedicionário Português. 
Um dos muitos melgacenses que combateu em França na Primeira Grande Guerra foi o soldado Nicolau de Souza Lobato. Natural de Alvaredo (Melgaço), era filho de José de Souza Lobato e de Hermínia da Glória Domingues, moradores na mesma freguesia. Foi incorporado no Regimento de Cavalaria 4 foi-lhe atribuída a placa de identificação nº 20179. Embarcou para França em 21 de Abril de 1917 no navio inglês Glosgon e terá chegado a Brest (França) a 25 de Abril.
Do seu Boletim Individual, constam alguns internamentos de vários dias. Contudo, não especifica se se trata de ferimentos em combate ou uma qualquer doença. Constam também algumas punições e detenções por desrespeito de regras. O soldado Nicolau de Souza Lobato sobreviveu à Primeira Guerra Mundial e regressaria a Portugal desembarcando em Lisboa a 25 de Junho de 1919.


Observe o seu boletim individual.Clique nas imagens para ampliar











sábado, 16 de janeiro de 2016

O "Drama de Alvaredo": a história de um crime e dos criminosos


Igreja Paroquial de Alvaredo (Melgaço)

No fim do século XIX, aconteceu no nosso concelho aquele que ficou conhecido como o “Drama de Alvaredo” ou o “Crime de Melgaço”,  os últimos cometidos por um bando de criminosos que mais tarde seriam capturados e julgados no tribunal de Melgaço em 1893.
O início da história conduz-nos a uma mulher chamada Maria da Piedade oriunda de S. João da Pesqueira e ao seu namorado Alfredo...
Maria da Piedade foi lavadeira mas não se deu bem. Apaixonou-se e passou a trabalhar junto do seu cabouqueiro, vendendo goles de aguardente. Mas o seu amor virou assassino e ela condenada por fogo posto.
Perguntou-lhe se não queria fazer um seguro da casa, pois se esta ardesse ganhavam algum dinheiro, mas Alfredo não quis, andava com outras preocupações, nos preparativos de coisa mais rendosa. Então, Maria da Piedade, meteu mãos à obra e fogo na casa em que habitava às portas da cidade de Lisboa. No meio disto, envolveu-se num assalto que acabou em assassínio e foi presa, com o seu amor, na cidade do Porto.
Dois anos antes, andava de um lado para outro, de galochas e odre a tiracolo, vendendo goles de aguardente ao pessoal da obra do túnel ferroviário de Lisboa, no lado de Campolide, na zona da Rabicha, a quinta que o caminho de ferro atravessará vindo do Rossio. Chamavam-lhe a Aguardenteira. A primeira ideia seria servir o namorado, mas o grupo de cabouqueiros a que este pertencia fez-lhe criar o negócio.
Maria da Piedade, nascida em São João da Pesqueira, distrito de Viseu, no ano de 1854, vivia com Alfredo Gomes, numa casa abarracada no sítio de Sant’ana, para lá da ribeira de Alcântara, onde hoje se localiza a Vila Ferro, no Bairro da Liberdade. Morava perto das obras do túnel da Rabicha, por isso, quando os homens esvaziavam a borracha, como chamavam ao recipiente que ela trazia ao ombro preso com uma correia, podia rapidamente ir enchê-la.
Piedade andava por ali, entre os trabalhadores, sem temer pelo físico. Não era mulher de se assustar, era valente “e mais temível do que muitos homens”, apesar de franzina. No sítio de Sant’ana, ninguém se metia com ela, “citavam-se proezas, na verdade extraordinárias, praticadas por aquela nova padeira de Aljubarrota”, escreveu em 1897 o jornalista Luiz Silva, na “Galeria dos Criminosos Célebres em Portugal” publicada em 1897. E andava com más companhias. O namorado e os cinco vizinhos que hão de entrar no assalto fatídico, eram ali conhecidos como “desordeiros, jogadores e amigos de galinhas”, segundo o jornal “A Vanguarda”.
Na sua folha corrida, constavam duas prisões por ofensas corporais, uma em outubro de 1890 e outra no mesmo mês do ano seguinte. Nada de  extraordinário. Antes de ser Aguardenteira, Maria da Piedade ganhou músculo lavando roupa. Mas não por muito tempo, o mundo das lavadeiras também não corria de forma pacífica. Era um negócio muito competitivo… Veja-se um caso passado em setembro de 1892, quando desapareceu uma saia à lavadeira Maria de Jesus. Decorridos onze meses, a governanta do tanque nº 6, onde se dera o roubo, reconheceu a peça de roupa na mão de Joana Maria, quis tirar-lha e, como a outra não cedesse, agrediu-a, pondo-a fora do tanque que geria.
“A guarda municipal da estação do Pasteleiro, a quem a Joana se queixou, interveio e quis arbitrariamente, fazer com que a Joana continuasse a lavar no tanque, chegando a querer obrigar a governante a acompanhar a parte do ocorrido para o quartel”, noticiou em 12 de agosto de 1893, rematando: “Se o caso se assim se deu, parece-nos incorreto o procedimento da guarda e para ele chamamos a atenção do sr. comandante”.
O caso não foi com a Maria da Piedade, aliás, ela já não se encontrava no continente quando se deu o desenlace, mas podia ter sido, dado o seu feitio. Uma agressão, ou mesmo um roubo, poderiam tê-la levado a mudar de profissão, todavia, sabe-se apenas que o negócio de lavadeira não lhe correu bem e, por isso, pensando no seu Alfredo, virou-se para a venda de aguardente nas obras do túnel que irão proporcionar viagens entre o Rossio e Sintra, ida e volta, a mil réis em 1.ª classe, 900 em segunda e 500 em terceira. Por esta época, um operário ganhava cerca de 200 réis por dia.
Os trabalhos começaram em 1887 e terminaram três anos depois, mas o primeiro comboio a testar a circulação no túnel fê-lo em abril de 1889, levou 27 minutos, hoje demora três. Foram escavados 2612 metros de rocha calcária, entre o Rossio e Campolide; com a abertura da estação central, em junho de 1890, ficou a linha férrea de Lisboa a Sintra, Torres e Figueira a Alfornelos com um movimento de 50 comboios diários. E o casal de Sant’ana, assim como os caboqueiros seus vizinhos, ficaram desempregados, por pouco tempo…
Piedade adorava o seu Alfredo. Quando forem presos, há de jurar-lhe que nunca o abandonará. Mais novo quinze anos do que ela, era um rapaz destemido, habituado a abrir caboucos e muitas vezes obrigado a alargar o campo de ação pela força das circunstâncias, significando esta a falta de dinheiro, por dispêndio excessivo em jogo e vinho, embora deste último não haja notícia de exageros, apesar do tempo que passava nas tabernas, com os seus companheiros, alguns de anos, outros mais recentes. Eram eles: António Fernandes, de 29 anos e de alcunha o Guerra, Santiago Rey y Lopez, de 37, António da Fonseca Pinto, de 35, João Esteves, de 24, e Romão Lousada de 24 ou 25 anos.
Alfredo Gomes, de 23 anos, nascido em Monção, não se saía mal, normalmente, quer dizer, nunca fora preso por roubar, tal como Maria da Piedade que não faria do roubo a sua ocupação principal, até ao malfadado dia em que um assalto deu para o torto e a polícia se revelou bastante eficiente. O namorado ganhara a sua coroa de glória num assalto na vizinha Espanha, do qual escapara por um triz, e isso dera-lhe confiança para continuar tivesse ou não trabalho na construção civil.
Ele e o Romão Louzada, um espanhol de Pontevedra, participaram, entre 1887 e 1889, num assalto a casa de um padre, no lado de lá da fronteira. Foram experimentar a ligação ferroviária à província de Salamanca, provavelmente, depois de trabalharem nas obras entre Barca de Alva e La Fregeneda, troço inaugurado em dezembro de 1887, mas quando apanharam o comboio já iam com o propósito do roubo. Eles e outros mais, desconhece-se quantos, uma vez que a coisa correu bem.
Assaltaram-lhe a casa à noite, a horas mortas. O padre espanhol ainda resistiu, não querendo dizer onde guardava o dinheiro. Mas não lhe serviu de nada, ao ver-se atado, deitado num colchão de palha a que os ladrões largaram fogo, logo se prontificou a revelar o esconderijo. Os meliantes extinguiram as chamas, agarraram no dinheiro e fugiram. O Romão, ligeiramente ferido, escondeu o roubo nas ceroulas e chegou bem a Lisboa, o Alfredo passou um momento de tensão quando, na estação da fronteira espanhola, o consideraram suspeito. Livrou-se, dizendo ser “limpiador do comboio e começando a fingir que o limpava”, contou “A Vanguarda”.
A dada altura, no mês de junho, João Esteves soube que uma sua tia de Monção, governanta em casa do reitor da freguesia de Trovisco, recebera um conto de réis de herança, e desafiou os amigos cabouqueiros. “Não acham que seria um golpe real apanharmos aquele dinheiro? Além disso o reitor também possui pé de meia. De uma cajadada matam-se dois coelhos. Que dizem?” Como o golpe de Salamanca dera uma boa maquia, Romão e Alfredo pensaram que não seria má ideia roubar outro sacerdote, já que estes possuíam sempre alguma riqueza. Dias depois, a 25 de junho, reuniram-se de novo, desta feita em casa de Alfredo e de Maria Piedade, para acertar o que fazer.
Enquanto os homens andavam nesta combinação, Maria da Piedade engendrava outra maneira de ganhar não apenas uns cobres, mas uma boa maquia. Para isso, nada melhor do que fazer o que já ouvira que outros tinham feito com resultados positivos. Dirá depois que o espanhol Santiago é que a incentivou. “Podemos ganhar bastante com isso”, ter-lhe-á dito numa tarde. Pouco tempo depois, ela, que “nunca mais tinha pensado no assunto” desde que Alfredo recusara a ideia, correu a segurar a casa por 500$000 réis.
Escondendo de Alfredo aquilo que preparava, Maria da Piedade foi combinando com Santiago como iriam dar o golpe à companhia de seguros. Na madrugada de 26 de junho, estando já acertada a ida para norte, faltando apenas decidir o dia, os dois cúmplices mudaram todo o recheio para casa do espanhol. De seguida, esfarelaram um colchão, espalharam a palha pelo solo, regaram-na com aguardente e pegaram-lhe fogo. A casa, localizada ao lado da igreja, ardeu completamente. “Para se avaliar bem a força da amante do Alfredo, basta dizer que ela se dirigiu à esquadra próxima, e pediu a dois polícias que lhe servissem de testemunhas para receber o dinheiro do seguro!”, observou Luís Silva.
O incêndio não alterou os planos dos cabouqueiros. No dia seguinte, Romão decidiu que era tempo de partirem. Mandou Maria da Piedade chamar Alfredo. Esta foi a Campo de Ourique, direita à obra onde o namorado (os jornais da época referem-nos sempre como amantes, por não serem casados) se encontrava por esses dias a trabalhar, e disse-lhe: “O teu primo João está preso”. Alfredo percebeu logo que estava na hora, porém, mais tarde, Piedade dirá que desconhecia ser uma combinação dos homens.
“Alfredo, para ter dinheiro para a viagem, empenhou uma mala com roupa, um relógio e cadeia de prata, numa casa de penhores em Alcântara, por 15$000 réis. O Guerra empenhou umas argolas e umas contas de oiro da amiga por 3$900 réis; Santiago levou 3$000 reis que tinha em casa; Fonseca levava só um tostão, abonando-lhe Romão o dinheiro para a passagem e João não levava nada, porque ia às ordens de Alfredo”, contou “A Vanguarda”, adiantando que Romão era o que tinha mais “capitais”, ainda lhe sobrava dinheiro de Salamanca
Conforme tinham combinado, entretanto, para dar tempo às diligências necessárias, encontraram-se os seis cabouqueiros na estação da Avenida (como também se chamava ao Rossio) a afim de seguirem caminho. Por segundos, perderam o comboio, e voltaram a perdê-lo mesmo depois da correria que fizeram até Santa Apolónia. Regressaram a casa aborrecidos, sem tensões de desistirem. Na noite seguinte, a 28 de junho, portanto, embarcaram pelas 23 horas, decididos a irem roubar a tia e o padre.
Deviam ter pensado que, por vezes, o destino dá os seus avisos. A viagem correu bem. Fizeram uma paragem em Sacavém para comerem e de manhã já estavam noutro comboio com destino ao Porto, do qual sairiam na cidade Invicta para chegarem a Valença. Não havendo mais hipóteses ferroviárias, foram a pé até à casa do reitor da freguesia de Troviscoso. Percorridos os quase 20 quilómetros de caminho, chegaram ali já de noite, mas nada fizeram, havia gente acordada a regar o cultivo à volta da casa. Refugiaram-se no bosque e, sendo meia-noite, voltaram a tentar, contudo, foram vistos por um criado que agarrou numa espingarda e disparou um tiro que os pôs em fuga.
João Esteves lembrou-se, então, de um rendeiro que morava ali perto e que também devia ter que roubar. Já que ali estavam, pensaram todos, aproveitariam para não regressarem a Lisboa de mãos a abanar. Lá foram. Muito embora fosse de madrugada, também depararam com dois homens de sachola a trabalhar na horta. Nada feito, quanto menos esperassem levavam com as ferramentas e aparecia gente armada como em Troviscoso.
Escondendo-se na mata conferenciaram. António Fernandes lembrou-se então que não muito longe, no lugar de Vilar, freguesia de Alvaredo (Melgaço), a sua mãe fora criada de um padre que possuía uma razoável fortuna. Mais uma caminhada, estavam com azar mas desta vez conseguiriam. Pelas duas horas da madrugada de 2 de Julho, entraram na casa do padre Sousa Lobato. Só Romão não ia armado, dera a sua pistola ao Guerra, já que este emprestara a sua ao João Esteves, de resto Fonseca levava um punhal, Romão uma navalha, Santiago um revólver e um cacete.
Quando entraram, apesar do Santiago ter feito algum barulho, nenhum dos residentes acordou. Mas ao procurarem o dinheiro no quarto do padre, não tiveram a mesma sorte. O religioso ainda deu luta, mas ficou muito ferido. Com os gritos, o irmão e o cunhado acudiram, envolvendo-se todos à pancada, com tal estrondo que acordaram a vizinhança e os cabouqueiros não tiveram outro remédio senão porem-se a andar. Foi uma fuga desordenada, a pé, até Braga. Estavam praticamente sem dinheiro. Romão tinha uma moeda de cinco duros, mas ninguém a trocava; Santiago pensou empenhar o revólver mas as lojas estavam fechadas; o Guerra e o Fonseca decidiram ir a pé até ao Porto…
Maria Piedade ficara em Lisboa, entregue a si própria, confiando Alfredo que ela daria bem conta do recado e que ainda ganharia algum com isso. Pensou bem. Apesar de ter havido alguma desconfiança quanto à origem do fogo, a companhia de seguros acabou por dar-lhe 114$000 réis, uma boa maquia, embora longe do valor do seguro. Com esse dinheiro, a Aguardenteira foi à casa de penhores buscar os pertences do namorado, e resgatou ainda alguma roupa, umas argolas de nove mil réis, dois anéis, um afagador com medalha, uma pregadeira, tudo em ouro.
Depois disso, a 31 de julho, partiu para a Invicta, onde ainda deu ao Santiago 12 mil réis pelo trabalho, dois mil para alugar uma casa para todos e 300 para a mudança. Todavia, beneficiaria muito pouco com todo este movimento. O padre Sousa Lobato sucumbira aos ferimentos no dia 23 de julho, a partir daí as investigações intensificaram-se, ganhando um impulso com o aparecimento de uma carta anónima que dizia serem os bandidos trabalhadores em Lisboa.
No dia 1 de agosto, Maria da Piedade e Alfredo, que arranjara trabalho nas obras da circunvalação, alugaram uma casa nas Fontainhas. Daí a três dias estarão todos presos, com exceção de João Esteves que só será apanhado, no dia 25, por um carabinero, muito perto da fronteira, e o Romão Louzada que desaparecerá para sempre. Quando o casal foi detido, já o Fernandes, o Fonseca e o Santiago se encontravam no comissariado de Lisboa. A polícia rondara a casa de Alfredo e Piedade, mas não os detetara, só os vês quando os dois aparecem a espreitar na porta da frente…
Maria da Piedade tem algumas manhas. Lê-se no jornal que assumiu que deitara fogo à casa para receber o dinheiro do seguro e que “fez importantes revelações” sobre o “Drama de Alvaredo” ou “O Crime de Melgaço” como o caso ficou conhecido. No dia 8 de Agosto, foi ouvida no terceiro comissariado e no Tribunal da Boa Hora. “Interrogada em juízo declarou-se autora do crime, como já o fizera na polícia, sendo depois remetida ao Aljube”, noticiou “A Vanguarda”. O seu processo ficou separado do dos cabouqueiros.
Passado um ano, a 3 de Agosto de 1893, os cinco vizinhos presos na Cadeia da Relação do Porto são levados ao tribunal de Melgaço. Milhares de pessoas aguardam à porta a entrada dos assassinos do padre Manuel António de Sousa Lobato. Oito anos de prisão e 20 anos de degredo foi a sentença para quatro, o Guerra seria poupado em oito anos de África porque se provou ter ficado de vigia.
Maria da Piedade, de 38 anos, já tivera o seu julgamento e seguira há três meses para África. Fora condenada pelo crime de fogo posto, como mandava o Código Penal de 1886: seis anos de prisão, seguidos de dez de degredo, ou, em alternativa, 25 anos em Angola.

Quando ainda no comissariado foi acareada com Santiago Rey de Lopez, já que este negava ter recebido “doce duros” para a ajudar e se mostrava renitente em admitir o assalto em Melgaço, Maria da Piedade disse-lhe: “Ande homem, confesse que eu já confessei. Se vocês não tivessem dado com a língua nos dentes, podiam matar-me que eu negava tudo, ainda que me apertassem o pescoço até deitar a língua de fora”.

Fonte: Jornal Expresso.

domingo, 10 de janeiro de 2016

Castro Laboreiro no Jornal da Tarde da RTP (10-01-2016)



Pequena reportagem sobre os costumes das gentes de Castro Laboreiro (Melgaço), nomeadamente, a vida nas inverneiras, nesta altura do ano...
Veja o Vídeo abaixo!...

sábado, 9 de janeiro de 2016

No tempo das grandes romarias à Senhora da Orada (Melgaço)

Capela da Orada (Melgaço)
Houve um tempo em que a Capela da Nossa Senhora da Orada (Melgaço) era destino de numerosos romeiros que ali vinham depositar os suas oferendas em nome de uma profunda devoção à Senhora da Orada que existia na região. A origem desta adoração à Orada tem origem no século XVI num surto de peste que flagelou a região. Diz-se que algumas terras na região, entre as quais Melgaço, foram poupadas. Em Melgaço, os habitantes contavam que fora a Senhora Orada que tinha livrado os melgacenses da peste.
Numa publicação de 1890, o “Archivo Histórico de Portugal”, faz-se referências ao tempo em que a capela da Orada era visitada por numerosos romeiros devotos em séculos anteriores.  O autor conta-nos que “Tem Melgaço um templo digno de menção, edificado sobre uma elevação sobranceira ao rio Minho, o qual, como se sabe, separa esta villa do reino vizinho. O atrio d’este é atravessado por uma estrada, que vindo da povoação parte para a Galliza.
O templo, da invocação de Nossa Senhora da Orada, é construído de boa cantaria e foi até 1834 da jurisdição dos monges do Convento de Santa Maria de Fiães. Desde a egreja à povoação é a estrada ladeada de formosas hortas, pomares, fontes abundantes de magníficas águas, vistosos campos e casas, o que dá o mais alegre e grato aspeto do sítio.
Do dia da Ascensão até ao domingo do Espírito Santo era outrora muito concorrida a estrada pelos romeiros do concelho de Melgaço, Valladares e Monção, os quais iam oferecer à Virgem da Orada o resíduo pascal, lavando cada freguesia os seus párocos, e ao menos uma pessoa de cada família.
Tinham estas romagens um voto que os povos das mencionadas freguezias fizeram durante uma terrível epidemia  de peste, que, tendo assolado e deixando desertas inúmeras povoações, áquelas não havia causado o mínimo damno.
Hoje, conquanto ainda tenha devotos, não é a egreja procurada como d’antes. A civilização fazendo pouco a pouco no espírito humano tem-lhe ensinado que o verdadeiro templo é a consciência próprio, que todos devem honrar e respeitar como um sanctuário que Deus nos collocou dentro do peito.”
Existe também uma lenda popular alusiva à Senhora da Orada e que remonta ao período da peste. Sendo verdadeira ou não, ajuda-nos a perceber a origem da extrema devoção à Orada nesta região. A lenda diz-nos que "Corria o ano da Graça de Nosso Senhor de 1569, e pelas terras do vale do Minho espalhava-se a peste. Em todas as freguesias as pessoas estavam apavoradas com o terrível flagelo. Ricos e pobres eram atacados por um grande febrão, e ninguém parecia escapar a esta desgraça. Cheios de pavor e de fé, todos se voltavam para os santos, pois só a eles parecia restar o poder para debelar tão grande infortúnio.
Por essa altura, morava no lugar da Assadura, junto da Senhora da Orada, Tomé Anes, mais conhecido como o "Vira-Pipas", pois andava sempre com uma malguinha a mais. Tomé Anes era uma figura alegre, mas um pouco desbocada, quando importunado com a alcunha. Para além de urnas pequenas leiras que amainava, Tomé limpava e arrumava a capela da Senhora da Orada,  trabalho que fazia com muito desvelo e devoção.
Numa certa manhã, como de costume, Tomé foi arranjar a capela. Como era ainda cedo, só tinha tomado o seu «mata-bicho», lá em casa, e uma pequena malga de vinho na tasca da Mirandolina. Chegado à capela, o "Vira-Pipas" quase morreu de susto, pois a imagem da Senhora da Orada não estava no seu lugar, nem em qualquer outro! Vezes acontecia que chegava a ver duas ou três imagens da Senhora, quando a borracheira passava do normal. Não ver nenhuma assustava-o seriamente. Cego não estava! Ainda perguntou à imagem do Senhor S. Brás pela ausente, mas como este não respondeu, pensou que teriam sido os Galegos os autores de tão vil afronta. 
Furioso saiu o "Vira-Pipas" em direcção à vila de Melgaço para comunicar o sucedido ao Alcaide, e disposto a juntar o povo para enfrentar tal desfeita. Ia o Tomé nestes propósitos pela via romana, quando o chamaram da casa do Arrocheíro para dar uma ajuda na trasfega do vinho. Este era trabalho a que nunca se negava o Tomé, já que entre o passar dos cabaços do vinho lá ia bebendo uma pequena malga do apreciado líquido. Depois de muito bebido e comido, deixou-se o "Vira-Pipas" levar pelo sono, de modo que já só noite dentro acordou e contou o sucedido para os lados da Orada ao seu amigo. Conhecendo os hábitos do Tomé, este só se riu, não acreditando em tão fantasiosa história. Mas como o Tomé insistia tanto, concordou em confirmar o acontecido com uma visita à igreja. Ao entrarem, verificaram que a imagem da Virgem estava no seu lugar. O único surpreendido era o "Vira-Pipas"!
No dia seguinte, muito envergonhado, decidiu o Tomé ir à Senhora da Orada mais cedo do que era costume. Para testar as suas capacidades, num grande esforço, não bebeu a sua malguinha de vinho, nem o imprescindível «mata-bicho»! Chegou até a meter a cabeça debaixo da fonte, para dissipar os possíveis vapores alcoólicos do dia anterior.
Na capela verificou que só estava o menino Jesus, sentado, com aquela cara de choro que toda a criança tem quando a mãe não o leva ao colo. Tomé ficou abismado, sem saber o que fazer. Com medo que se rissem dele, não contou a ninguém, preferindo entregar-se ao trabalho, ao ponto dos conhecidos ficarem admirados com tal dedicação. De manhã e à noite ia à capela, e verificou que a senhora da orada voltava à noitinha. Umas vezes levava o menino, outras não. Só o Tomé sabia destas fugas, e pressentiu naquele mistério uma grande responsabilidade. Não lhe passava da ideia o que lhe acontecera, julgando-se destinatário de uma mensagem da Senhora para que abandonasse o consumo do álcool. Por isso, começou a diminuir no vinho, o que a todos surpreendeu!
Enquanto isto sucedia ao pobre do Tomé, em Riba de Mouro no concelho de Monção, os habitantes viraram-se para a milagrosa Senhora da orada a fim de se livrarem da mortífera peste, que por aqueles anos assolava toda a região. Para agradar à Senhora, prometeram uma romagem anual à capela.
Depois de aparecerem os primeiros casos, surgiu na dita freguesia uma senhora, muito bonita e educada, que dizia saber como tratar aquela doença. Ninguém sabia donde ela viera. Entrava na casa das pessoas doentes, mandava fazer um chá com uma planta que trazia no alforge, e, juntando outras ervas, mandava preparar um banho que ela própria passava no corpo do doente, fosse mulher, criança ou homem. Recomendava às pessoas que se lavassem com ervas de Santa Maria e folhas de sabugueiro, que defumassem as casas com alecrim, e lavassem as roupas amiúde. A bondosa dama não tinha mãos a medir! De manha até à noite, não parava de atender os doentes. Não comia nem aceitava convite para ficar à noite com eles. Quando trazia um menino, que dizia ser seu filho, este ajudava a descobrir a erva de Santa Maria e os sabugueiros que o povo não sabia onde mais encontrar.
Entretanto passaram-se quarenta dias, e a peste abrandou. Poucas pessoas sobreviveram ao flagelo, mas em Riba de Mouro ninguém morreu! A senhora que tinha ajudado a população desapareceu tal como havia surgido. Todos se perguntavam agora sobre a identidade daquela misteriosa senhora. Alguém se lembrou, então, que a roupa, e até a fisionomia, eram iguais à da Senhora da Orada!
Nesta certeza, logo partiram em romaria ao seu santuário, agradecendo a protecção. Vendo tal devoção e escutando o sucedido, o Tomé entendeu rapidamente o que lhe tinha sucedido e resolveu contar a todos os desaparecimentos da Senhora naqueles dias anteriores. Agora, todos acreditaram! Os romeiros partiram, espalhando o relato do milagre por todas as freguesias."

Como já foi referido, esta devoção à Senhora da Orada foi-se perdendo ao longo dos tempos e no final do século XIX, o número de romeiros visitantes já não era significativo.



Informações extraídas de: Archivo historico: narrativa da fundação das cidades e villas do reino, seus brazões d'armas, etc. (1890), 2ª Série, Typ. Lealdade, Lisboa.

sábado, 2 de janeiro de 2016

A história de um ministro originário de Melgaço: um dos maiores estadistas do seu tempo

Ministro Martinho de Mello e Castro, originário dos Castros de Melgaço 

Martinho de Mello e Castro é uma das altas figuras da História de Portugal oriundas de Melgaço. Foi um reconhecido estadista e desempenhou o cargo de Ministro da Marinha de Guerra no tempo do rei D. José e D. Maria I entre outras importantes funções. Nasceu em 1716 e viria a falecer em 1795.
Quase 100 após a sua morte, encontrámos numa publicação de 1890, o "Archivo Histórico de Portugal", um texto muito elogioso à sua vida e à terra de origem da sua família e que nos dá uma real dimensão da sua notoriedade. Nele podemos ler que “Cabe a esta villa também a honra de ter sahido da família dos Castros de Melgaço o laureado ministro da nossa Marinha, Martinho de Mello e Castro, nome altamente sympathico e bemquisto da nação.
Nasceu o ilustre varão a 11 de Novembro de 1716. Seguiu a carreira ecclesiástica e em 1739 foi nomeado cónego da sé patriarchal. Seguiu depois a carreira diplomática, e estava ministro em Londres, quando rebentou a guerra entre a nação dos piratas, a Hespanha e a França.
O patriótico ministro prestou então valorosos serviços ao paíz, já enviando armas e munições de guerra, já envidando todos os meios para dar lustre ao nome portuguêz. Coube-lhe a elle assignar a paz em Paris, o que realizou,  salvaguardando a honra e os interesses nacionaes como um verdadeiro portuguêz.
D. José nomeou-o ministro e secretário de estado dos negócios da marinha, em 1777. Martinho de Mello tomou o mais vivo interesse no desenvolvimento da marinha de guerra portuguesa, e esteve sempre ao lado do grande Marquez de Pombal, em todos os commettimentos de utilidade pátria. Conquanto não fosse affeiçoado ao severo ministro, que tanta influência teve no reinado de D. José, coadjuvou-o sempre que se tratava do engrandecimento e prosperidade nacional. Depois da queda de Sebastião José de Carvalho e Mello, continuou a dirigir a pasta da marinha com a mais evidente intelligência e sollicitude.
A este hábil ministro de deveu a magnífica esquadra que então houvemos. Ainda quando D. João VI fugiu covarde e criminosamente para o Brazil, deixando a pátria nas garras do inimigo bonapartista e do pirateiro alliado, se compunha a esquadra de guerra portugueza de doze fragatas , e doze naus  de linha, afora muitas outras embarcações de menor importância. Isto em 29 de Novembro de 1807.
Hoje, temos o Pimpão e meia dúzia de chavecos, incapazes de aguentarem os embates do oceano em revoltas de borrasca.
Ah! Mas é que já não existem homens como o Marquez de Pombal e Martinho de Mello, à frente da administração pública!
O digno estadista conservou a pasta da marinha até à data do seu fallecimento, em 24 de Março de 1795. Possuía inalteravelmente a mais clara intelligência e foi activo no desempenho da sua nobre missão até que a morte o prostou, velho nos annos, sempre novo na pujança do espírito, e no discernimento da acção.

Em Luanda, conhecemos ainda um transporte de guerra com o nome do ilustre ministro. Há annos desarmou este vaso da nossa marinha, e ainda não houve quem se lembrasse de dar o nome de Martinho de Mello a outra qualquer embarcação de guerra. Em troca, há-os que têem nomes que nada significam, a não ser a máxima insignificância.”


Extraído de: Archivo historico: narrativa da fundação das cidades e villas do reino, seus brazões d'armas, etc. (1890), 2ª Série, Typ. Lealdade, Lisboa.