domingo, 2 de março de 2014

Poesia popular casteja (início do século XX)

Castro Laboreiro, 1903


No ano de 1904, estava José Leite de Vasconcelos nas Termas do Peso. Num belo dia, montado numa mula e acompanhado do Padre Manuel José Domingues, abade de Melgaço e de mais duas mulheres guias, lá vão até Castro Laboreiro num duro percurso (ainda não havia estrada). Em Crasto, fez uma interessante recolha de usos e costumes, incluindo poesia popular, de tradição oral, da época.
No seu artigo "Excursão a Castro Laboreiro", onde conta tudo sobre esta viagem, Leite de Vasconcelos reproduz uma série de quadras da tradição popular casteja:


Adeus, ó bila de Crasto,
As costas lh’eu bou birando,
Im que lh’eu as costas bire,
Meu coraçom bai chorando.


Adeus, ó bila d’Acastro,
Probência de Tras-os-montes,
No dia que t’eu nõ bêjo,
Meus olhos são duas fontes 
(quadra variante de uma outra popular na região transmontana)

Adeus, ó terra de Crasto
As costas te bou birar,
Bou para o bal de Chabes (refere-se ao vale de Chaves)
Donde m’eu bou desterrar.

Fita berde no chapéu
Meu amor, nõ lh’a ponhais,
Dá-lh’o bento abole, abole…
E eu côido que m’açanais!

Heid’ amar o cordom berde,
Im quanto tiber berdura,
Hei-d’amar a quem quijer
Q’inda nõ fije scritura.

Neste lenço deposito
Lágrimas que por ti choro
Por nõ poder alcançar
Os braços de quem adoro

Esses teus lindos olhos
Som cadeias de bom ferro,
Prisões que me a mim sigurã…
Eu outras já as nõ quero.

Alfaite, guarda a filha,
Nõ na ponhas na jenela,
Os soldados da marinha
Nõ tirã os olhos dela.

Alfaites nõ som homes,
Nem se lhes póde chamar,
Quando pérdim uma agulha,
Logo se põ a chorar!


Extraído de: VASCONCELOS, J. Leite de (1916) - Excursão a Castro Laboreiro in: Revista Lusitânia, Lisboa.

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